Novas tecnologias geram novos hábitos que, por sua vez, geram novas demandas.
E isso pode ser aplicado ao setor elétrico. As smart grids, ou redes elétricas inteligentes, são um conceito que surge para modernizar a cadeira de geração, transmissão e distribuição e garantir que o sistema seja capaz de atender à nova realidade de pessoas e empresas.
Por meio de tecnologias como Internet das Coisas (IoT), Inteligência Artificial e digital twins, essas redes prometem trazer muitos benefícios tanto para as companhias do setor quanto para os consumidores.
A seguir, vamos entender como funcionam as smart grids e seus impactos na sociedade. Boa leitura!
O que são as smart grids?
As smart grids, ou redes inteligentes, são sistemas avançados de distribuição de eletricidade que utilizam tecnologias digitais e de comunicação para tornar o fornecimento de energia mais eficiente e dinâmico.
Diferentemente das redes convencionais, que seguem um fluxo unidirecional, as smart grids operam com fluxo bidirecional de eletricidade e dados. O fluxo de dados bidirecional possibilita tanto o monitoramento quanto operações remotas em tempo real.
Esse tipo de rede integra sensores e sistemas de automação e comunicação que capturam dados a todo momento, permitindo ajustes rápidos conforme a demanda.
Com essas informações em tempo real, as redes inteligentes conseguem reagir de maneira rápida a alterações no consumo, evitando sobrecarga e interrupções.
Como funcionam as redes elétricas inteligentes?
As redes elétricas inteligentes tem como um dos seus pilares fundamentais a digitalização do setor elétrico. Basicamente, elas incorporam à distribuição de energia diversas tecnologias que possibilitam descentralizar o setor e agregar novas formas de relação entre os agentes.
Como explicamos, em uma rede inteligente, os equipamentos da rede de distribuição são dotados de sensores que coletam e compartilham dados a todo instante – estamos falando de Internet das Coisas (IoT) e todas suas possibilidades.
Isso permite aos agentes de distribuição uma maior capacidade de identificação de ocorrências na rede e de gerenciamento eficiente dos ativos de acordo com a demanda e suas condições operacionais. Tudo de forma remota e com mínima intervenção humana.
Logo, o sistema ganha mais eficiência e resiliência, reduzindo o desperdício de energia e a quantidade de interrupções no serviço.
Além disso, as smart grids tornam a rede mais diversificada e transformam o papel do consumidor, até então interpretado como passivo. Agora, em vez de apenas consumir energia sem autonomia, empresas e pessoas podem acompanhar e programar seu gasto de eletricidade, agindo de modo ativo no sistema. E mais: eles podem atuar na compra e venda de energia entre si.
Dessa forma, os consumidores passam não só a ter mais controle sobre o que consomem e a forma que fazem isso, mas também podem se tornar microgeradores de energia, vendendo o excedente do que geram e não consomem – geralmente a partir de painéis solares.
É o que tem se chamado de “prosumidor” (produtor + consumidor), isto é, a criação de um fluxo bidirecional de geração distribuída, em oposição ao modelo unidirecional convencional.
Como as redes elétricas inteligentes estão sendo implementadas no Brasil
No Brasil, as redes elétricas inteligentes vêm sendo implantadas, sobretudo, por meio de projetos pontuais, mas as iniciativas têm ganhado expansão.
Iniciativas de Cemig e Eletropaulo
Um exemplo é o projeto Cidade do Futuro, realizado pela concessionária Cemig, na cidade de Sete Lagoas/MG. A iniciativa tem trazido informações importantes sobre a geração distribuída e a automação da distribuição por meio das smart grids.
Outro caso importante é a cidade de Barueri, em São Paulo. A concessionária local, Eletropaulo, iniciou em 2013 o que foi o primeiro grande teste de redes elétricas inteligentes no Brasil.
A iniciativa envolve a instalação de medidores inteligentes para entender o consumo mensal e permitir aos consumidores o acionamento remoto de aparelhos eletrônicos, dando mais autonomia e controle para as pessoas e empresas.
O projeto Urban Futurability na Vila Olímpia
Outro exemplo de destaque é o projeto Urban Futurability, implementado na Vila Olímpia, na cidade de São Paulo, em uma parceria entre a CERTI e a ENEL.
Entre as medidas para modernizar a rede elétrica, a iniciativa focou na implantação de tecnologias para formação de gêmeos digitais (digital twins) da rede elétrica e implantação do conceito Laboratório Vivo (Living Lab) para testes em campo de tecnologias disruptivas no setor elétrico.
A tecnologia permite representar virtualmente os ativos físicos da rede e avaliar seu funcionamento. A partir de dados coletados por sensores inteligentes, é possível criar mapas da rede e modelos 3D, o que possibilita fazer testes e simulações, aumentando a capacidade de prever ocorrências e a vida útil dos equipamentos.
Avanços na agroindústria com smart grids
Em 2024, a fazenda Dom Perignon, pertencente ao Grupo Sementec, localizada em São Desidério, na Bahia, deu início a um projeto inovador de irrigação alimentado por energia solar e térmica.
Com uma usina de smart grid com capacidade de 4,4 MW, a fazenda conseguiu reduzir em até 70% o consumo de diesel, além de dobrar a produção de soja, resultando em um aumento de R$ 5 milhões na produtividade agrícola.
Expansão das redes inteligentes no Paraná pela Copel
Um dos maiores programas de modernização de redes de distribuição de energia da América Latina está em andamento em mais de 50 cidades no Oeste do Paraná.
É a terceira fase do projeto Rede Elétrica Inteligente da Copel, que consiste em substituir medidores convencionais por versões inteligentes capazes de transmitir dados em tempo real para os centros de controle da empresa.
Essa fase é realizada em parceria com a Nansen, especialista em medição de energia e infraestrutura para redes inteligentes, e conta com a instalação dos medidores pela Eletromil, empresa já envolvida em outros projetos da Copel.
O Plano Nacional de Redes Elétricas Inteligentes
Vale ressaltar que, em maio de 2023, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 2932/2015, que estabelece o Plano Nacional de Redes Elétricas Inteligentes.
A proposta seguiu para o Senado com o objetivo de diminuir perdas elétricas, promover o uso eficiente da infraestrutura e permitir que os consumidores façam o gerenciamento de sua energia.
O projeto também inclui incentivos regulatórios e fiscais para que as concessionárias substituam medidores eletromecânicos por modelos inteligentes em um prazo de até 15 anos, nas regiões onde houver viabilidade econômica e condições técnicas.
Principais projetos no mundo de redes elétricas inteligentes
De acordo com o Global Smart Meter Market Tracker 2020–2030 da IoT Analytics, a penetração dos medidores inteligentes de eletricidade atingiu 43% no mercado global.
As iniciativas de modernização da rede elétrica começaram no final dos anos 2000 na Itália e nos EUA, acelerando para implementações nacionais na UE e APAC após 2010.
Políticas regulatórias e incentivos financeiros de governos regionais ou nacionais contribuíram para esse crescimento, encorajando as concessionárias a substituir medidores convencionais por inteligentes.
Um estudo da Juniper Research aponta que, até 2029, o potencial de economia das redes inteligentes aumentará em 249%. Esse crescimento é impulsionado pelo aumento de investimentos em soluções por parte de governos, incluindo EUA, China e Europa.
Principais iniciativas de redes elétricas inteligentes pelo mundo
Na Austrália, o projeto “Smart Grid, Smart City” busca entender os benefícios das redes inteligentes. Essa parceria com a iniciativa privada ajuda na tomada de decisões para o governo, empresas e consumidores.
Seguindo essa tendência, a China está promovendo smart grids para reduzir o consumo e aumentar a eficiência, além de impulsionar a geração de eletricidade a partir de fontes renováveis.
Nos Estados Unidos, a modernização da rede elétrica está sendo impulsionada pelo programa Grid Resilience and Innovation Partnerships (GRIP), que se concentra na resiliência a eventos climáticos extremos e na proteção de comunidades desfavorecidas.
A União Europeia apresentou, em 2023, uma reforma do mercado de eletricidade, introduzindo um mecanismo de Contrato por Diferença bidirecional para novos investimentos em eletricidade de baixo carbono.
Inspirados por essa reforma, os Países Baixos lançaram o Programa Nacional de Ação de Congestionamento da Rede, que acelera investimentos e reduz filas de conexão.
No Canadá, o governo está investindo US$2,2 bilhões no Smart Renewables and Electrification Pathways Program, com um plano de financiamento ao longo de 13 anos.
Na América do Sul, a Argentina está expandindo seu sistema de transmissão de eletricidade de alta tensão, enquanto o Brasil leiloou a expansão de cerca de 4.500 quilômetros de transmissão de energia.
A Índia, com seu esquema do Corredor de Energia Verde, aprovou a construção de um sistema de transmissão interestadual para evacuar 13 GW de capacidade gerada em Ladakh. O Japão está conectando Tóquio à ilha de Hokkaido e aumentando a capacidade de transmissão entre Kyushu e Chugoku em 30% até 2030.
Na África do Sul, a revisão do Plano de Recursos Integrados em 2023 prioriza o desenvolvimento da rede de transmissão, reforçando a importância da modernização das redes elétricas em todo o mundo.
Conheça os benefícios de uma Smart Grid
Como vimos até aqui, as redes elétricas inteligentes têm o potencial para, do lado das concessionárias, reduzir o desperdício de energia ao longo da rede e diminuir o tempo de interrupções; e, do lado dos consumidores, entregar maior qualidade aos serviços de energia elétrica e permitir a redução de custos por meio da venda de excedentes produzidos por eles próprios.
No entanto, há outras vantagens que as smart grids podem proporcionar e que merecem ser citados:
Redução do desperdício e tempo de interrupção
Para as concessionárias, as redes elétricas inteligentes oferecem a capacidade de reduzir o desperdício de energia ao longo da rede. Isso ocorre pela descentralização do setor e graças à automação e inteligência agregada à detecção de falhas.
Em caso de danos, essas redes conseguem isolar a área afetada, evitando que o problema se espalhe e, assim, reduzindo o tempo de interrupção do fornecimento de energia e impactando o mínimo de consumidores. Ademais, setores prioritários, como hospitais e escolas, têm mais segurança no abastecimento.
Aumento da confiabilidade do sistema
Com o uso de tecnologias avançadas de digitalização e comunicação, como gêmeos digitais e sensores inteligentes, as redes conseguem monitorar e responder em tempo real a diversas condições. Essa capacidade de monitoramento ajuda a reduzir o risco de falhas e incidentes.
Por meio da simulação de situações diversas, é possível antecipar problemas e adotar medidas preventivas, o que aumenta a confiabilidade do sistema como um todo.
Autonomia para o consumidor e otimização do consumo
As smart grids fornecem informações em tempo real sobre o consumo de energia, permitindo ao consumidor tomar decisões conscientes.
Essas ferramentas permitem que os clientes gerenciem melhor o consumo, identificando os momentos mais econômicos para utilizar energia. Com isso, é possível alcançar economias financeiras e incentivar práticas mais eficientes no uso de energia, promovendo uma gestão ativa da demanda.
Ampliação da sustentabilidade ambiental
A integração de fontes de energia renovável nas redes inteligentes promove a sustentabilidade. As smart grids facilitam a geração distribuída de energia e o uso de tecnologias de emissão zero, como painéis solares, turbinas eólicas e hidrogênio verde.
Além disso, essas redes aceleram a pulverização da infraestrutura de carregamento para veículos elétricos, contribuindo para a redução das emissões de CO2 e impulsionando o uso de energias mais limpas e sustentáveis.
Facilidade no armazenamento de energia
O armazenamento eficiente de energia ainda é um desafio, mas as redes inteligentes possibilitam o avanço no uso otimizado dessa tecnologia.
Com uma infraestrutura adequada, as redes podem armazenar o excedente gerado e redistribuir a energia conforme a demanda.
O resultado é uma maior flexibilidade no gerenciamento da oferta de energia e o funcionamento mais otimizado do sistema, principalmente em picos de consumo.
Capacidade de atender a novas demandas de energia
A eletrificação de setores, como o transporte, requer uma rede preparada para lidar com o aumento no consumo. Redes elétricas inteligentes têm a capacidade de gerenciar essas novas demandas de forma distribuída e eficiente.
A eletrificação de frotas de veículos, por exemplo, pode ser absorvida pela rede sem sobrecarregar o sistema, já que as smart grids possibilitam ajustar automaticamente o fornecimento conforme a demanda regional e horária.
Aumento da automação e redução da intervenção humana
A automação é uma característica fundamental das redes inteligentes. Com a capacidade de operar, detectar, analisar e responder a falhas de forma automática, as smart grids permitem a operação sem a necessidade constante de intervenção humana.
Nesse nível, a automação possibilita respostas rápidas e precisas a incidentes, garantindo que o sistema se recupere com mais agilidade e confiabilidade.
Tendências de smart grids
As redes inteligentes estão se expandindo com novas tecnologias que tornam a geração e distribuição de energia mais flexíveis e resilientes. Confira algumas das tendências principais para esse setor no Brasil.
Redes descentralizadas
Com o avanço das redes descentralizadas, as perdas energéticas para o transporte de energia é reduzido, possibilitando a redução na fatura de energia e entregando uma energia mais barata para o consumidor.
Estas redes também possibilitam a agregação de pequenas fontes de geração renováveis, acelerando a descarbonização do setor.
Além disso, redes descentralizadas podem utilizar blockchain para gerenciar de forma autônoma a negociação de energia entre usuários.
Blockchain na negociação de energia
O uso de blockchain nas transações de energia elimina intermediários e facilita contratos inteligentes de compra e venda dentro do mercado livre. A tecnologia permite preços fixos em acordos de compra de energia (PPA), aumentando a automação das redes inteligentes.
Esse modelo garante mais autonomia e facilita o comércio direto de energia entre consumidores e produtores, beneficiando todo o sistema.
Integração de fontes distribuídas de energia (DERs)
Fontes de energia distribuídas, como painéis solares e turbinas eólicas, são opções renováveis que possibilitam novas tecnologias para otimização integrada com a rede.
No Brasil, o uso crescente de DERs exige atualizações regulatórias e ferramentas avançadas para garantir a estabilidade do sistema.
Sistemas de armazenamento de energia
Os sistemas de armazenamento, como baterias e hidrelétricas reversíveis, oferecem maior flexibilidade para a gestão da demanda e oferta de energia.
Em momentos de baixa demanda, estes sistemas armazenam o excesso de energia para utilização em horários de pico, postergando a necessidade de ampliar a capacidade de geração. Esse recurso auxilia na variabilidade das fontes renováveis.
Microgrids e operação local
As microgrids são pequenas redes locais que podem operar de forma independente ou conectadas à rede principal. Elas ganham força em áreas remotas e rurais, pois oferecem resiliência, reduzem custos e melhoram a qualidade da energia.
Com o avanço das tecnologias de controle e automação, microgrids estão se tornando uma alternativa viável para regiões que necessitam de soluções de energia otimizadas, confiáveis e eficientes.
Exemplos de smart grids
As redes inteligentes já estão sendo aplicadas em diferentes locais, utilizando tecnologias específicas para garantir um sistema de energia mais eficiente e resiliente, promovendo a interoperabilidade de ativos e de recursos.
Abaixo, confira algumas das soluções mais comuns:
Medidores inteligentes
Os medidores inteligentes são dispositivos avançados que monitoram o consumo de energia em tempo real, facilitando o controle tanto para consumidores quanto para fornecedores.
Eles registram dados de uso automaticamente, permitindo ajustes no consumo e melhor precisão nas formas de serviços de faturamento. Além disso, ajudam a identificar rapidamente falhas na rede, agilizando a manutenção.
Equipamentos de monitoramento de rede
Esses equipamentos, como sensores IoT e sistemas supervisórios, fornecem visibilidade contínua do estado da rede. Em uma smart grid, esses dispositivos permitem a coleta de dados em tempo real e monitoramento remoto, o que facilita uma resposta rápida a falhas e otimiza a operação da rede.
A capacidade de monitoramento constante é um recurso essencial para reduzir o tempo de inatividade e aumentar a confiabilidade do sistema.
Dispositivos de Internet das Coisas (IoT)
Dispositivos IoT, como lâmpadas e termostatos inteligentes, estão integrados nas smart grids para fornecer dados em toda a cadeia de energia, trazendo a visão de Smart Home, parte de um sistema smart grid.
Eles permitem que fornecedores acompanhem o consumo em tempo real, auxiliando no gerenciamento eficiente da rede e permitindo comandos de atuações diferenciados.
Os dispositivos IoT tornam o sistema mais responsivo às variações de demanda e oferecem insights que ajudam na tomada de decisões em larga escala.
Sistemas de armazenamento de energia
O armazenamento de energia é fundamental para a estabilidade das smart grids, especialmente com o crescimento de fontes renováveis, como solar e eólica.
Baterias e outras soluções de armazenamento possibilitam guardar o excedente de energia para liberação em momentos de maior demanda.
Assim, a rede se torna menos dependente da geração contínua e garante uma reserva energética para emergências.
Tecnologias de cibersegurança
Como as redes inteligentes são interconectadas, a cibersegurança se torna indispensável para proteger esses sistemas contra ataques. Ferramentas avançadas de segurança, como monitoramento proativo e segmentação de rede, ajudam a identificar e bloquear ameaças.
Esse nível de proteção é crucial para evitar interrupções e proteger dados sensíveis em um ambiente altamente conectado.
Fontes de energia limpa
Para garantir uma energia mais sustentável, as redes inteligentes incorporam diversas fontes de energia limpa, como solar, eólica e hidrelétrica.
Além disso, a integração de fontes renováveis com a smart grid contribui para a sustentabilidade e independência energética da rede.
As smart grids têm o potencial de transformar o setor elétrico, promovendo eficiência e sustentabilidade. Integrando tecnologias avançadas como IoT e Inteligência Artificial, elas modernizam a infraestrutura energética, facilitam a adoção de fontes renováveis e reduzem desperdícios.
Nesse contexto de inovação, a Fundação CERTI se destaca como uma parceira para impulsionar essa transformação.
Com expertise multidisciplinar em redes inteligentes, a Fundação abrange áreas como medição, gerenciamento de energia e digitalização de redes elétricas.
Suas operações variam desde a análise de viabilidade até o desenvolvimento e inserção de produtos no mercado, tornando-a um ator chave na evolução das smart grids.
Para conhecer mais sobre a atuação da Fundação CERTI no setor energético, visite nosso site e explore nossas iniciativas em redes inteligentes.